Texto originalmente publicado por Carlos Felipe dos Santos em 04/mar/25.
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O mundo está envelhecendo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a população com 60 anos ou mais deverá ultrapassar 2 bilhões até 2050. No Brasil, os dados do IBGE apontam que, em 2030, o número de idosos deve ultrapassar o de crianças e adolescentes até 14 anos. Esse fenômeno traz desafios importantes para os serviços de saúde, especialmente no cuidado com pacientes idosos e crônicos, que frequentemente apresentam dificuldade na obtenção de acesso venoso.
Com o avanço da idade, há redução da espessura da pele, diminuição da elasticidade, perda de tônus muscular e alterações no tecido subcutâneo. Além disso, muitos pacientes idosos fazem uso crônico de medicamentos que comprometem a integridade vascular, tornando a punção venosa periférica um verdadeiro desafio. Nesse cenário, técnicas alternativas ganham espaço como soluções viáveis — entre elas, a hipodermóclise.
Múltiplas tentativas de obteção de acesso venoso periférico geram dor, incomodo e lesões. Hipodermóclise é técnica antiga que ajuda na infusão de medicamentos de forma segura e eficaz. Imagem: Kirill Dratsevich/pexels.
A hipodermóclise é uma técnica antiga, utilizada desde o século XIX, que consiste na infusão de líquidos e medicamentos no tecido subcutâneo. Popular no início do século XX, foi amplamente utilizada antes do advento das técnicas modernas de punção venosa. Porém, com o desenvolvimento de cateteres intravenosos mais seguros e eficazes — como o agulhado (scalp) e, posteriormente, os não agulhados (Jelco/Abocath) — , a hipodermóclise foi gradualmente abandonada.
No entanto, frente ao aumento da população idosa e à crescente dificuldade de acesso venoso em muitos pacientes, essa técnica voltou a ser considerada uma alternativa segura, prática e de baixo custo, especialmente em ambientes domiciliares, paliativos e em unidades de internação com recursos limitados.
Pacientes oncológicos e em cuidados de fim de vida sõa os que mais se beneficiam da hipodermóclise. Imagem: truthseeker08/pixabay.
A hipodermóclise consiste na infusão contínua de líquidos ou medicamentos no tecido subcutâneo, geralmente nas regiões do abdome, face lateral da coxa, região escapular ou peitoral. A absorção ocorre por meio da rica vascularização do tecido subcutâneo, permitindo que a medicação atinja gradualmente a corrente sanguínea.
Por essa característica, a hipodermóclise é contraindicada, por exemplo, para os casos de emergência, em que a reposição volêmica ou infusão de medicamentos precisa ser rápida.
A técnica é simples: consiste em utilizar um cateter sobre agulha, em geral, de calibre 24G ou 22G, ou mesmo um cateter agulhado (scalp) 25G ou 23G, para atingir o tecido subcutâneo. A agulha deve ser introduzida por meio de uma prega cutânea em um ângulo de 45º graus, como mostra a ilustração abaixo:
Tecido subscutâneo e o angulo necessário para que o cateter alcance a via correta. Imagem: Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.
Após, desfaz-se a prega, fixa-se o dispositivo e, por fim, uma película transparente é colocada sobre o mesmo.
Como citado anteriormente, a infusão deve ser lenta. O fluxo máximo recomendado é de 1 mL/min por sítio de infusão, com volume máximo de 1.500ml por dia. Em caso de necessidade de maior volume, pode-se utilizar até dois sítios simultâneos.
Sìtios de infusão da hipodermóclise. Imagem: Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.
Ao término da infusão do medicamento, deve-se lavar o acesso com 2ml de soro fisiológico. Em relação a validade, esta é de 7 dias para os casos do uso de cateter não agulhado. Por isso, a importante de colocar a data no curativo.
Muitos medicamentos administrados por via endovenosa podem ser utilizados na hipodermóclise. Algumas, até, não precisam de ter a posologia alterada, afinal, para muitas medicações, a concentração plasmática obtida pela hipodermóclise é semelhante à da via venosa, com excelente eficácia clínica.
Hipodermoclise realizada com cateter sobre agulha (scalp). Imagem: Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.
Contudo, é necessário cautela: essa via de administração é, na maioria das vezes, off label, e há divergências na literatura quanto à compatibilidade, estabilidade e eficácia de determinadas drogas por esta via. Portanto, a prática deve ser fundamentada em protocolos institucionais, respaldo científico atualizado e avaliação clínica individualizada.
Abaixo segue uma lista das medicações frequentemente infudidas pela via subcutânea:
Lista de medicações indicadas para uso pela via subcutânea. Imagem: Sírio Libanês.
Apesar da técnica permitir que até 3 medicações sejam administradas concomitante, nem todas são compatíveis entre si. A interação pode alterar a eficácia ou até mesmo causar complicações. Para estes casos, as medicações devem ser administradas em sítios diferentes ou com pelo menos 1 hora de intervalo entre elas.
Veja abaixo a tabela de incompatibilidade de medicações:
A hipodermóclise ressurge como uma alternativa eficaz e acessível, especialmente para pacientes idosos, acamados ou em cuidados paliativos, onde a obtenção do acesso venoso representa um desafio. Simples, segura e com baixo custo, essa técnica deve fazer parte do arsenal terapêutico de profissionais da saúde, sobretudo em tempos de envelhecimento populacional e necessidade de práticas resolutivas.
Ao considerar a hipodermóclise, é fundamental respeitar os princípios da boa prática clínica: conhecer a técnica, avaliar a compatibilidade medicamentosa e garantir o conforto e a segurança do paciente. Ressignificar o uso dessa via pode representar um grande avanço no cuidado humanizado e eficiente.
*Esse texto foi gerado com auxílio de ferramentas de inteligência artificial e contou com revisão humana.